terça-feira, 12 de abril de 2011

Um engano meu

Cartoon de Henrique Monteiro
   "Mandou parar o táxi um quarteirão antes, misturou-se com as pessoas que seguiam na mesma direcção, como que deixando-se levar por elas, anónima e sem nenhuma culpa notória. Entrou no hotel com ar natural, atravessou o vestíbulo para o bar. Chegara adiantada alguns minutos, portanto devia esperar, a hora do encontro havia sido combinada com precisão. Pediu um refresco, que tomou sossegadamente, sem pôr os olhos em ninguém, não queria ser confundida com uma caçadora de homens vulgar. Um pouco mais tarde, como uma turista que sobe ao quarto a descansar depois de ter passado a tarde nos museus, dirigiu-se ao ascensor. A virtude, quem o ignorará ainda, sempre encontra escolhos no duríssimo caminho da perfeição, mas o pecado e o vício são tão favorecidos da fortuna que foi ela chegar e abrirem-se-lhe as portas do elevador. Saíram dois hóspedes, um casal idoso, ela passou para dentro, premiu o botão do terceiro andar, trezentos e doze era o número que a esperava, é aqui, bateu discretamente à porta, dez minutos depois estava nua, aos quinze gemia, aos dezoito sussurrava palavras de amor que já não tinha necessidade de fingir, aos vinte começava a perder a cabeça, aos vinte e um sentiu que o corpo se lhe despedaçava de prazer, aos vinte e dois gritou, Agora, agora, e quando recuperou a consciência disse, exausta e feliz, Ainda vejo tudo branco."
                                                         José Saramago in "Ensaio sobre a Cegueira"(1995) 

Em Janeiro, na Eleição Presidencial, votei Fernando Nobre. Tive sempre uma enorme admiração por este homem, e pela AMI, que ele fundou. Até tenho os livros dele. Apesar de eu ser de Esquerda (mas sempre sem Partido), confiei o meu voto nesta pessoa, porque me pareceu uma lufada de ar fresco na política portuguesa. Mesmo não concordando com algumas das suas propostas, como a redução do número de Deputados, dei-lhe um desconto e mantive a esperança de poder derrotar o Cavaco. Com as notícias que surgiram nos últimos dias, dando conta que ele será o nº1 por Lisboa nas listas do PSD para as Legislativas, lembrei-me de um velho militante trotsquista com quem eu, às vezes, conversava, com prazer, e que detesta Fernando Nobre. Várias discussões acesas nós tivemos acerca das ONGs, e de pessoas a elas ligadas. Esse Sr., velho militante trotsquista do POUS, deve estar a rir-se com isto tudo. Tenho que lhe telefonar, tenho saudades de falar com ele.
(Oh Nobre, logo o PSD a que eu sou e serei sempre alérgico!!!). 

3 comentários:

  1. Na política vale tudo. Até tirar olhos...

    ResponderEliminar
  2. Meu amigo:
    Identifico-me completamente com este teu excelente post.
    Excelente escolha de imagem e de texto.
    "O pior cego é aquele que não quer ver ".
    Também me sinto completamente defraudada,quando pensamos já ter visto tudo, aparece algo que nos surpreende...negativamente como este caso :(
    Beijinhos

    ResponderEliminar
  3. Vai logo!
    Liga pro velho militante. Estão acabando os velhos militantes.
    Abração!
    Berzé

    ResponderEliminar